miércoles, mayo 17, 2006

as linhas. (di)versión en portugués

As linhas, (di)versão em português.
Perguntam-me sobre as linhas desta cidade. Sim, elas podem ser retas. Planejaram e construíram uma parte delas e o fizeram cartesianamente. Diagonais e grandes vias que vão de ponta a ponta. E ligam pequenos oásis de ruas tortas. Povoados que existiam antes, com ruas estreitas, irregulares, feitas de pedras pesadas, escuras e cheias de musgo. Exalam permanência. As linhas retas vieram depois. Elas não atraem turístas. Os engenheiros de transito sim sabem apreciá-las. Há carros e motocicletas que passam rápido por ali. São como uma foto que se tira de noite em que se vêm apenas linhas de luzes vermelhas e alaranjadas. Existências fugazes como luzes que se acendem e apagam. Faróis que acendem e apagam. Vermelho, verde. E amarelo piscante: amarelo-negro-amarelo-negro. Negro: há crise energética na Europa, diz a manchete no jornal. Em meu país, meninos comem luz, diz a canção.
Mas eu também gosto das linhas retas porque elas sabem dissimular. É preciso segui-las de perto para encontrá-las sinuosas, como o desenho que se esconde no muro. Leves, como as curvas da negra gorda que dança ao lado do banco no parque. Desafinadas, como o violão do garoto que toca na festa de jovens comunistas. Traiçoeiras, como o Avante que eles entoam. Seja como for, elas não dizem para onde devemos ir. Nem eles. E nem como devemos ir. De carro alugado, dizem eles. Mas antes de fazer revolução, eu ainda planejo comprar uma bicicleta de segunda mão no Gloriès. Dizem por aí que as ciclovias desta cidade acabam em lugar nenhum. Assim como tudo?
Toda a manhã eu olho o caminho do trem pela janela da biblioteca e penso que os meus caminhos pouco se parecem com ele. Eu sempre vou pelos caminhos sinuosos. Como uma imagem do que preferiria ser. Ou do que uma boa parte de mim é e gostaria de aparecer. Será que é isso que atrai os turistas no Born? Há ruas estreitas e sinuosas também no Raval. Mas há poucos turistas lá. Há paquistaneses nas esquinas, sempre em duplas, como nos jogos de fliperama. Dizem que há também bares. Disfarçados. Esfumaçados. Com portas estreitas e música no final. Poderia ir ao Raval na sexta à noite. Poderia. Quisera. Mas sempre exagero na curva e acabo em círculos. Como a pista de corrida. Três voltas, às vezes quatro. Três vezes, às vezes quatro: o mesmo homem sentado no banco, com o cachorro ao lado. O papel de sorvete do domingo. O cheiro ruim de coco de pato. Quantos Martins há neste parque? As estatísticas dizem que três dentre quatro pessoas que freqüentam o parque a essa hora estão a beira do abismo.

2 comentarios:

Anónimo dijo...

O doutor voltou... Parabéns!
Eu tb estou na beira do abismo, no pior devaneio! Cadê a terça psiquiatria? Flora moçárabe longínqua... O poeta come amendoim (ou paçoca?). Além disso, gosto muito do novo layout. Até logo. Bjs!

Anónimo dijo...

Olha que coisa mais linda, mais cheia de graça...